“Vai estudar”, ou o que dizer quando você não tem mais argumentos
"Você não concorda comigo, então você está automaticamente errado" |
Nos últimos tempos tenho sido surpreendido com uma nova mania dos
extremistas de direita: mandar estudar. Digo de direita não
duvidando que extremistas de esquerda estejam agindo da mesma forma,
ainda mais que extremistas de ambos os lados cada vez se parecem
mais, em um ótimo exemplo da teoria da ferradura, mas comigo pelo
menos ainda nenhum extremista de esquerda se manifestou desta forma.
Só nos últimos dois meses, foram três vezes que me mandaram
estudar: a primeira, um vereador de minha cidade que estava
defendendo o a ditadura militar instaurada em 1964, o segundo um
desconhecido da internet falando contra Direitos Humanos, e o
terceiro um conhecido defendendo que estupros e violência não fazem
parte da bíblia.
É engraçado que os três usaram o argumento no mesmo instante do
debate, quando terminaram seus argumentos, ou seja, quando as
premissas que haviam apresentado defendendo seus pontos de vista
foram derrubadas pela apresentação de fatos históricos, argumentos
filosóficos ou mostrando que estavam usando de falácias (em
especial no debate sobre Direitos Humanos).
Mas mais engraçado fica ainda quando eu lhes respondi: ok, devo
estudar? Mas o que devo estudar? Somente os autores que concordam com
você? Ou posso estudar livremente? Quais livros e, principalmente,
quais trabalhos acadêmicos publicados você me recomenda? Os
trabalhos tal e tal (aqui em geral usei artigos ou livros que já
li), os quais já li não servem como estudo? Eu já li trabalhos que
concordam com seu ponto de vista e posso listar no que discordo deles
embasado em outras leituras, você já leu trabalhos que discordem de
seu ponto de vista? Se sim, quais trabalhos e em que discorda deles?
O que há de engraçado nisso? OS TRÊS desconversaram! Um deles até
tentou me dizer: ora, trabalhos sérios, não tendenciosos; mas
quando retruquei dizendo que os trabalhos citados não eram de
cubanos ou de revistas socialistas francesas, mas sim publicados por
historiadores norte-americanos, passou ao ad hominem, atacando
minha falta de religiosidade como prova de que eu estava errado…
Em suma, pude compreender o que significa, realmente, vá estudar:
significa “se você pensa diferente de mim você automaticamente
está errado”, “se você estudou algo com o qual não concordo,
não importa se a Academia concorda, não importa se está em todos
os livros de história, está automaticamente errado, e o que eu
penso, ainda que todos os historiadores discordem, ainda que não
tenha embasamento a não ser em uns poucos autores que não são
levados a sério, é o certo”, mas significa, sobretudo, “eu não
sei mais o que dizer, seu filho-da-puta respondão e bem informado!”
Em suma, mandar estudar é antes de tudo uma tentativa de diminuir o
outro, de dizer “você não está no meu nível, seu ser inferior”,
mas é também uma tentativa desesperada de calar alguém que está
apresentando verdades incômodas, que destroem a visão de mundo de
quem está mandando estudar.
Por tudo isso, esta atitude autoritária não me surpreende mais,
apenas me faz saber que pressionei alguém com premissas pobremente
embasadas até um ponto em que ele não consegue mais argumentar;
contudo, apesar de não me chocar mais, a atitude sempre me faz rir,
pois quem age assim sempre parece criança fazendo birra, dizendo
“meu pais é mais forte que o teu”, e rir, segundo o poeta,
sempre melhora nosso dia!
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