O Díptero


Seu nome, na verdade, poucos sabiam; quiçá apenas seus amigos mais chegados, seus ‘confirmados’, como costumava dizer. O apelido, ganhara em uma das inúmeras aulas sem que o vi ‘voando’, pensando no último artigo científico que lera, no último projeto eletrônico ou no filme de sempre (um besteirol chamado A Vida de Brian, do Monty Python).
Foi assim: o professor era um tremendo sacana e fez, a um dos alunos, uma pergunta daquelas bem babacas, do tipo: “se você seguir por essa rua, onde você vai dar?”
Meu amigo, nesse momento, despertando do devaneio, saltou rápido com as palavras:
— Vou dar no quartel.
O que fez com que todos ríssemos com gosto.
— Pô, moscão, e a pergunta nem era pra ti...
As risadas, então, se transformaram em gargalhadas, e dali pra frente todos (com exceção, quiçá, dos ‘confirmados’) passaram a chamá-lo de Moscão.
No princípio, ele odiou o apelido maldoso; mais de uma vez eu o vi atirar pedras em quem o chamasse desta forma, mas com o tempo, foi se afeiçoando e, quando tínhamos uns 17 anos, era assim que assinava nossos grafites (acrescentando, às vezes, a frase “isca para brigadiano”).
Eu o considerava mais do que um amigo; talvez o irmão que nunca tive; mas às vezes não podia me furtar de usar o apelido, geralmente acrescentando: “é por essas e outras que te chamam de Moscão”...
Uma dessas não raras ocasiões ocorreu em uma noite fria de inverno, quando voltávamos para casa, do colégio, após termos deixado as respectivas namoradas em suas casas – devo acrescentar que, para cúmulo das coincidências, namorávamos duas Cláudias que, ainda por cima, eram vizinhas.
Mas como ia dizendo antes de devanear, seguíamos pela 15 de Novembro e, pouco depois de passar pela 14 de Julho, a luz se foi e a cidade ficou totalmente às escuras, exceto pelo brilho da lua cheia.
Até aí tudo bem, seguimos caminhando e conversando, até que ouvi um barulho às nossas costas. Olhei e, a uns cinco metros, se aproximava um pequeno grupo que, mesmo à distância e com pouca iluminação, pareceu-me mal intencionado.
Como sempre fazia, usei de psicologia, já que minhas pernas curtas e o fôlego de asmático não me permitiriam correr; pus a mão dentro da jaqueta como se estivesse armado e virei para trás; o teatro surtiu efeito, o bando parou e começou a cochichar entre si.
Moscão, recém se dando conta de que havia mais alguém na rua, se virou e viu o bando:
— Cara, e nós sem uma arma! – expressou, fazendo com que os larápios pulassem na mesma hora e nos largassem só de cuecas (até meu botton do Lula levaram).
Depois da ação, entre o tristes e o eufóricos com a adrenalina, sentados no meio-fio, não pude resistir:
— Pô, cara, é por essas e outras que te chamam de Moscão...

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