Homem primata
Na segunda
passada (23/4), em conclusão à aula da qual participei como monitor da
disciplina Universo em Evolução e Evolução da Vida na Terra no dia 9/4 (aqui relatada), assisti
junto à turma do 1º semestre de Ciências da Natureza ao vídeo “O Que Darwin Não
Sabia”, da BBC.
Após o vídeo, uma colega me fez um
questionamento sobre a evolução humana. Não foi a primeira vez que ouvi a
pergunta e, desta forma, explico aqui, resumidamente, o que sei sobre o assunto,
visando explica-la a outros que também a tenham e quem sabe dar minha modesta
colaboração para o entendimento desta tão pouco compreendida – mas mesmo assim
tão debatida – Teoria da Evolução.
A indagação é,
nas palavras de minha colega: Se evoluímos do macaco, então por que nós paramos
de evoluir? O macaco um dia vai se transformar em ser humano?
Em primeiro
lugar, se você não sabe o que é, basicamente, a Teoria da Evolução, sugiro que
comece por O Capelão do Diabo e as moscas sem asas, neste blog.
Mas
prossigamos, dividindo a pergunta em partes.
O homem descende do macaco?
Não, ao menos
se você pensar nos macacos modernos. Somos primatas, parentes próximos dos
chimpanzés e bonobos, com os quais tivemos um ancestral comum há uns 6 milhões
de anos. Mas somos parentes também dos outros primatas – nos separamos do ramo
que deu origem ao gorila há uns 7 milhões de anos, do ramo que deu origem aos
orangotangos há 14 milhões– e macacos – nosso ancestral comum com o gibão viveu
há 18 milhões de anos, com os macacos do velho mundo há 25 milhões de anos e
com os macacos do novo mundo há 40 milhões de anos (dawkins, 2010).
Mas não se
surpreenda, da mesma forma somos aparentados com o bacalhau, com quem tivemos
um ancestral comum há 440 milhões de anos. Na verdade, se você recuar tempo o
suficiente, encontrará um ancestral em comum com todas as espécies vivas
conhecidas (op. cit.).
Por que paramos de evoluir?
Na verdade não
paramos. Mutações ocorrem a toda hora. Eu, por exemplo, não tenho uma mutação
presente na maioria dos caucasianos: a tolerância à lactose. Conhecem a
Síndrome de Down? Pois é uma mutação genética, a trissomia do cromossomo 21
(nossos cromossomos são diploides, ou seja, pareados; temos 23 pares ou 46
cromossomos; nessa mutação o cromossomo 21, ao contrário do par de cromossomos,
tem um trio). Quase toda a mutação é desvantajosa mas, em nossa sociedade,
essas desvantagens, na maior parte das vezes, não são fatais, ou seja, a
seleção natural não age sobre nós graças ao avanço de ciências como a medicina,
a higiene ou ao aumento da disponibilidade alimentar.
Pense, porém, hipoteticamente,
que o vírus da Aids desenvolvesse uma nova estratégia de infecção: ao invés de
contato com fluídos, como atualmente, que ele se replicasse como a gripe. Em pouquíssimo
tempo a humanidade estaria infectada, estaríamos fadados a morrer (vamos
esquecer por um momento que a ciência criou drogas como o AZT).
Mas espere! Nem
tudo está perdido, há seres humanos imunes ao HIV! Esses Homo sapiens sapiens são tão humanos quanto eu ou você (há uma
possibilidade, ainda que remota, que um de nós seja um deles), que tem a
mutação de faltar parte do DNA presente no gene CCR5; essa mutação, que vem
sendo estudada como possibilidade de criação de uma vacina ou de medicamentos
mais eficientes, causa uma má formação no receptor por onde o vírus penetra na
célula (freeman e herron, 2009).
No caso da
Aids-gripal, talvez 99% dos seres humanos fossem extintos. Os portadores da
mutação no CCR5, entretanto, sobreviveriam e passariam essa característica a seus
descendentes. Isso é seleção natural; dela vem a evolução, ou seja, a adaptação
ao meio.
O macaco um dia vai se transformar em ser
humano?
Não. Tivemos
uma evolução em separado, pelo menos, nos últimos 6 milhões de anos. Houve o
que se chama em biologia evolutiva de especiação, ou seja, a divisão de uma
espécie em duas. A partir desse momento, quando as espécies não podem mais
produzir descendência viável e fértil, seus caminhos evolutivos tornam-se
totalmente distintos. Talvez (e aqui entro no ramo da especulação pura, mas a
possibilidade evolutiva, ainda que pequena, existe), um dia, alguma espécie de
primata pudesse desenvolver inteligência similar à nossa.
Talvez ele
perdesse o pelo por outra adaptação, passasse a andar ereto, achatasse a face,
diminuísse a dentição, passasse a usar ferramentas complexas (primatas
superiores usam ferramentas simples), desenvolvesse uma cultura, enterrasse
seus mortos, construísse pirâmides e computadores. Ainda assim, eles não seriam
Homo sapiens sapiens.
Talvez fossem Pan sapiens sapiens, se descendessem
diretamente de chimpanzés ou bonobos, talvez fossem Gorilla sapiens sapiens. Entretanto, por mais similares que
fossemos, ainda assim seríamos espécies distintas; não poderíamos produzir
descendência e, portanto, o macaco não teria se tornado humano, embora
estivéssemos dividindo o mundo com outra criatura inteligente, como já
dividimos com outros hominídeos tais como nosso primo Homo sapiens neanderthalensis, extinto há quase 30 mil anos (foley, 1993).
Finalizando,
deixo minha satisfação em ter podido, ainda que dentro de minhas limitações,
ter respondido à pergunta, ao mesmo tempo em que teço aqui um elogio a quem a proferiu
(não citarei o nome por não ter pedido sua autorização), em minha opinião, ela agiu como um verdadeiro
cientista: com curiosidade, ceticismo, sem preconceito e sem medo de fazer os
questionamentos, ainda que a resposta possa lhe ser desconfortável.
Referências bibliográficas:
DAWKINS, Richard. A grande história da evolução. São
Paulo: Companhia das Letras, 2010.
FOLEY, Robert. Apenas mais uma espécie única. São
Paulo: Edusp, 1993.
FREEMAN, Scott e HERRON, Jon C. Análise Evolutiva. 4ª Edição. Porto Alegre: Artmed: 2009.
Muito bom o texto. Continue assim!
ResponderExcluirGrato por sua manifestação.
ExcluirGrato por sua manifestação.
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